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segunda-feira, 23 de julho de 2012

Marcos Evangelista Villela Júnior e o Aribu



Marcos Evangelista Villela Júnior era ainda tenente de infantaria , em 1911, quando construiu seu primeiro avião, um pequeno monoplano Bleriot, no Rio de Janeiro. No ano seguinte, montou outro avião semelhante. Da experiência adquirida com esses dois monoplanos pertencentes ao Ministério da Guerra, decidiu projetar outra aeronave, maior, que seria o biplano Alagoas, terminado em 1918.
Descrita assim em resumo, a obra de Villela Júnior parece bem fácil. Mas, seria injustiça ignorar toda a dedicação e esforço desse obstinado oficial do Exército, que lutou contra a descrença das autoridades da época para implantar uma verdadeira aviação militar em seu país.
Villela nasceu em 24 de março de 1875 em Vila Mairus, município de Pão de Açúcar, no estado de Alagoas. Aos dois anos de idade foi levado a Pernambuco, onde concluiu seus primeiros estudos. Desde pequeno demonstrou fascínio pelo voo das aves.
Eu ficava deitado, observando os urubus”, contou mais tarde a um biógrafo. “E pensava que se as aves tinham meio naturais para voar, porque o homem, inteligente, e engenhoso, não poderia imitá-las?” Numa época em que existiam apenas balões, tal ideia era pouco menos que um sacrilégio.
Em 1900, finalmente foi admitido na Escola Preparatória de Tática, no Realengo (Rio de Janeiro). E, quando os primeiros aviões começaram a voar no Brasil, ele previu acertadamente o valor bélico dessas máquinas voadoras. Mas nem todos pensavam do mesmo modo e suas ideias foram encaradas pela maioria dos colegas como brincadeiras de um sonhador.
Em 1912, depois de concluir a construção e as provas dos dois Bleriot adquiridos pelo exército, o tenente Villela concluiu o projeto de um avião inteiramente nacional. E foi levá-lo ao Ministro da Guerra, na ocasião o General Vespasiano de Albuquerque. Seu projeto foi secamente recusado. Naquela época o governo estava às voltas com uma grave crise no Ceará e o General Vespasiano julgava pouco oportuna a ideia de gastar dinheiro com projetos experimentais.
Mas a negativa de apoio oficial não deteve o obstinado tenente. Ele hipotecou sua casa e seus bens e, com a ajuda de amigos, construiu um pequeno monoplano.“Meus colegas apelidaram-no Aribu, como lembrança da história que lhes havia contado de meus sonhos de menino, quando sonhava voar como os urubus”. Aribu o aparelho foi batizado. Aribu com “A” e não com “U”. E Aribu ficou sendo chamado.

O Aribu de Villela Junior.
 Há poucas informações sobre as características técnicas dessa aeronave. Sabe-se que era um monoplano, dotado de motor rotativo francês de cinco cilindros e hélices de madeira, fabricadas pelo próprio Villela. O inventor levou seus escrúpulos de pesquisador até o estudo detalhado dos diferentes tipos de madeira nacional e à construção de uma balança para aferir o equilíbrio das hélices.
Fiz um novo desenho, sui generis, estabeleci quatorze coeficientes, e construí até uma balança. Enquanto José Domingos da Silva procurava fazer hélices de peroba e açoita-cavalo, e muitos outros supunham ser aconselhável o aproveitamento da nogueira, divergi deles, ensaiando mais de oito carroças de diferentes tipos de madeira em minhas experiências. Cheguei a conclusão de que a ingarana era superior a todas as outras madeiras indicadas”.
No total, mais de 25 hélices foram construídas no galpão dos fundos da casa de Villela Júnior, no Realengo (Rio de Janeiro).
A fuselagem do Aribu era, igualmente em madeira, assim como as asas, cobertas ambas com tecido nacional envernizado. Tendo estudado vários tipos de tecidos, Villela produziu na Fábrica de Tecidos de Sapopemba uma tela de algodão de qualidade tão boa que a fábrica mandou-a para Exposição de Buenos Aires, em 1918, onde foi premiada com a Medalha de Ouro.
O verniz também era seu e de excelente qualidade. Certa ocasião o Aeroclube de Montevidéu escreveu-lhe, pedindo que vendesse a fórmula de seu verniz. Na sua resposta Villela Júnior demonstrou a grandeza de seu entusiasmo pela aeronáutica: “Para a aviação nada vendo. Com muito prazer tudo darei para o seu progresso”. E mandou a fórmula pelo correio.
Concluídos os testes com o Aribu, o já Capitão Villela Júnior voltou ao Ministério da Guerra, levando dessa vez os planos de uma aeronave de maior porte. Esse avião seria o “Alagoas”, assim batizado em homenagem ao seu Estado Natal.

O aeroplano Alagoas.

O Ministro era o General Caetano de Faria, que se mostrou entusiasmado com o projeto do jovem oficial. Deu-lhe uma pequena verba e foi com esses recursos que ele montou o “Alagoas”, utilizando a fuselagem de uma avião “Bleriot” modificada e equipada com asas de novo desenho. O motor era um Luckt importado, de 80 HP. Mas o resto do aparelho utilizava apenas materiais nacionais.
No dia 11 de novembro de 1918, no Campo dos Afonsos, Villela e seu “Alagoas” foram oficialmente apresentados às autoridades.  Presentes o Ministro da Guerra, Marechal Caetano de Faria, além de um grande número de oficiais das diversas unidades sediadas no Rio de Janeiro, seus familiares e jornalistas.
Diante dos convidados, o piloto Tenente Vieira de Mello e o mecânico Benine tomaram lugra na cabina. O motor foi acionado e o aparelho levantou voo, após 60 metros de corrida. Depois, durante quinze minutos executou manobras perfeitas: voos de dorso, subidas até 800 metros, mergulhos e passagens rasantes. O pouso foi perfeito e a aeronave estacionou exatamente no mesmo ponto de onde tinha decolado.

Exibição do aeroplano Alagoas.
 Essa demonstração comoveu profundamente a opinião pública e o governo. Nos meios políticos começou a ganhar corpo a ideia da criação de uma Arma de Aviação independente. E tanto no Exército como na Marinha, surgiram oficiais defendendo a ampliação do número de aeronaves militares brasileiras.

Nenhum desses movimentos obteve resultados imediatos. Mas a semente fora lançada, graças ao esforço de Villela Júnior, que passou para a reserva como general e foi, mais tarde, promovido a brigadeiro do ar, quando surgiu o Ministério da Aeronáutica.
A fase áurea dos projetos pioneiros praticamente termina com o “Alagoas”. Pelo menos no Rio de Janeiro e em São Paulo. Nos anos da década de 1920 foram projetados ou construídos mais de doze aviões de diferentes tipos, frutos, quase todos eles, do esforço de grupos ou empresas. Também a aviação militar ganhou maior impulso.
De certa forma, isso não foi um fenômeno apenas brasileiro. Na Europa, os anos 20 caracterizaram-se pelo rápido crescimento da aviação. E os projetistas europeus tiveram grande influência sobre os pioneiros da indústria aeronáutica brasileira.



Fontes:
A Construção Aeronáutica no Brasil 1910/1976 – Roberto Pereira de Andrade